Relatos audiovisuais criados no período de isolamento durante a pandemia de covid-19.
a linha que conduz minha vida
Julia Francisca
revela-se a cada descontinuidade
se a vida é um tecido aberto
em eterna costura
Urano é o próprio tecer da vida
com Urano atravessamos a ponte
a ponte cai
o que temos então é a fenda-fresta
não há retorno possível, lugar de origem
o raio subitamente ilumina
as linhas agora, são linhas de fuga
apontam para o estranho
vir-a-ser do mundo
é possível dar passagem ao raio?
se entregar ao espanto ?
Eu estou ausente porém no fundo desta ausência
Vicente Huidobro
Existe a espera de mim mesmo
E esta espera é outro modo de presença
À espera de meu retorno
Eu estou em outros objetos
Ando em viagem dando um pouco de minha vida
A certas árvores e a certas pedras
Que me esperaram muitos anos
Cansaram-se de esperar-me e sentaram-se
Todas as coisas do mundo
Alberto Martins
carregam consigo uma ternura selvagem.
O primeiro passo é não temer o selvagem.
O segundo, remover a ganga de diamante e
gordura que a linguagem socou
em cada um de nós.
Agora vem a parte mais difícil.
É preciso sonhar tudo de novo.
Tudo está em deixar amadurecer e então dar à luz. Deixar cada impressão, cada semente de um sentimento germinar por completo dentro de si, na escuridão do indizível e do inconsciente, em um ponto incansável para o próprio entendimento, e esperar com profunda humildade e paciência a hora do nascimento de uma nova clareza (…).
Rainer Maria Rilke